Parada a cerca de dois anos, devido a um embargo solicitado pelo Ministério Público Federal, a Hidrovia do Marajó aguarda um parecer técnico mais aprofundado para ter continuidade. Visando a liberação da obra - que vai reduzir em 142 Km a distância navegável entre Belém e Macapá.
O Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA-PA) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) estão trabalhando em cooperação e rediscutindo o assunto junto com a comunidade técnica-científica. No ultimo final de semana um seminário na sede do CREA-PA reuniu representantes dos dois órgãos e do Ministério Público Federal.
O Governo do Estado, que seria representado pela Sectam, não compareceu prejudicando os trabalhos.
A ausência causou mal-estar, mas a OAB e o CREA prometem manter a discussão. "A hidrovia é uma necessidade e não um brinquedo político. Se o governo do estado não estiver interessado é bom que saiba que 400 mil paraenses estão", declarou o Advogado Franklin Rabêlo.
Através de parceria entre o governo estadual e federal, com contrapartida de 50%, foram realizados todos os estudos técnicos (projeto executivo) e ambientais (EIA/Rima) para a dragagem do canal de 32 Km destinado a perenizar a interligação dos rios Atuá e Anajás. A obra reduz dos atuais 580 Km para 432 Km a distância entre Belém e Macapá. Para isso, será necessário dragar mais de dez milhões de metros cúbicos da área situada entre os rios, a fim de garantir a passagem de comboios com capacidade total para 2.800 toneladas na rota Belém-Macapá-Belém.
A hidrovia criará um eixo central do transporte, proporcionando a revitalização do transporte de carga já existente nesta rota: mudança do padrão tecnológico das embarcações e nova dinâmica das atividades produtivas do arquipélago e do Estado do Amapá.
A obra permitirá acesso aos diversos recursos naturais da região marajoara, modernização do parque agropecuário e suprimento dos mercados consumidores de Belém e Macapá, viabilizando a criação de bacias leiteiras e estimulando a piscicultura. Também são alinhados entre os impactos sócio-econômicos o desenvolvimento do turismo flúvio-ecológico e integração nacional do Marajó e do Amapá. através da futura hidrovia Tocantins/Araguaia.
A hidrovia vai atravessar pelo meio a ilha, no sentido sudeste/noroeste levando novas oportunidades de emprego e de geração de renda a toda população local.
O incremento do turismo vai proporcionar a instalação de hotéis, bares e restaurantes. Além de todo um complexo de lazer ecológico, preservando o meio ambiente e as características locais. Os turistas poderão desfrutar das praias de rio, dos igarapés e furos, enquanto se deliciam com açaí e o camarão, o artesanato em cerâmica, as danças típicas e os peixes saborosos da região.
Também vai gerar recursos para que sejam construídas mais escolas, mais postos de saúde, com extensão da rede elétrica e de água tratada, além de tantas outras melhorias. A facilidade de acesso vai proporcionar a implementação ininterrupta das campanhas de saúde pública junto às comunidades ribeirinhas. A primeira hidrovia totalmente construída na Amazônia vai significar o fim do isolamento do arquipélago Marajoara e a melhoria do índice de Desenvolvimento Humano (IDH) na região.
Novos mercados consumidores serão abertos aos produtos Marajoaras, fronteiras serão expandidas.
A União e o governo do Estado já garantiram os 28 milhões de reais necessários á construção da hidrovia. O projeto executivo do canal foi licitado e os equipamentos principais para sua implementação estão prontos para entrar em operação.
Diz o ditado que sonhar não custa nada. Mas quando o sonho é construir uma hidrovia ligando o arquipélago do Marajó ao Amapá, o sonho tem um preço - algo em torno de 28 milhões de reais - e também um tempo, pelo menos 30 anos. Foi ainda nos anos 60 que um jovem estudante marajoara chamado Franklin Rabêlo da Silva, depois de empreender uma viagem que durava em média três a quatro dias em barco veleiro do município de Chaves para Belém, vislumbrou a possibilidade de se construir uma hidrovia que encurtasse a distância entre o arquipélago e a capital. "Naquela época tínhamos que contornar o cabo do Maguari para chegar até Belém", conta.
Em 68, uma dessas viagens quase acaba em tragédia. O barco "Casemiro Beltrão" de médio calado, em que Rabêlo viajava junto com alguns parentes, acabou encalhando no banco de areia conhecido por "Rabo da Onça", próximo ao Cabo do Maguari.
Para evitar que o barco fosse arrastado oceano a dentro pelas correntes marítimas, os tripulantes tiveram que jogar ao mar parte da carga, entre ela 40 reses que vinham para o matadouro de Belém. Um episódio marcante que mostra o perigo a que estavam expostos os barcos naquela época e a necessidade de uma hidrovia na região.
Através de estudos feitos sem qualquer ajuda oficial, Rabêlo começou a pensar num modo de tornar a viagem menos penosa. A solução foi uma ligação entre a baía interna do rio Anajás com o rio Atua. criando uma extensa hidrovia cortando o arquipélago. Pelos primeiros cálculos, o canal teria apenas 5km, mas logo se comprovou que seria preciso o dobro.
O projeto final, no entanto prevê um longo desvio numa reserva arqueológica. O comprimento final do canal ficou em 32km.
A hidrovia só começou a ser "comprada" pelo poder público em 1980, depois que o idealizador deu uma entrevista ao jornal "Folha do Norte". Uma equipe do extinto Instituto de Desenvolvimento do Pará (Idesp) se interessou pelo assunto e reproduziu a entrevista, acrescentando alguns dados técnicos, na revista "Pará Desenvolvimento", publicada pelo instituto. Foi a primeira vez que a opinião publica e a comunidade científica - tomaram conhecimento do assunto. Hoje a hidrovia depende apenas de entraves burocráticos. O "sonho" parece mais próximo do que nunca. Vencida esta etapa, é possível que daqui a dois anos o próprio Franklin, hoje um respeitável advogado de 62 anos de idade, possa estar navegando nas águas tranquilas de sua hidrovia. "Sei que trabalhamos para as gerações futuras, mas tenho total confiança que isso vai acontecer".
Lacênio Barbosa
Revista Indústria, Comércio e Serviços. Ano I, nº 2, 2001.
Lacênio Barbosa
Revista Indústria, Comércio e Serviços. Ano I, nº 2, 2001.
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